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3 de fevereiro de 2014

Na cama da vida

Se te vais deitar
na cama da vida
calçando as meias da indiferença,
matando o desejo que te vem buscar,
de nada adiantará
depois
ficar de olhos exageradamente abertos,
buscando o tato no breu,
com o coração palpitando na espera das suas carícias
ou
do sussurro em teus ouvidos.

24 de maio de 2011

Cerâmica

Avanço sem busca
Em campos de folhagens laminadas
Onde passeio as mãos entre o capim distraído.
E do meu suorsangue fertilizado
Florescem papoulas e crisântemos.
Sem mariposa, alma alada.

Sem inseto, pneuma ou psiquê que voeje contente por sobre a colheita onde os pássaros têm o seu simpósio.
Sem cereal, azeitona ou vinho a armazenar a ânfora decorada por Helena.
Ânfora sem alma para preencher.
Estética apagada na fluidez do rio onde foi abandonada para os arqueólogos do futuro.
E rio, rio, rio...
Até que reste somente a argila dura.

Recipiente preenchido de memórias,
Que são nada.
Vazio.
Mas ainda assim tapado.
Meu barrocorpo é tudo que sou.
Mais não há.
Ou há.
Loucuras de artistas esquecidos que foram e já não são mais nem serão outra vez.

Sou todo matéria.
Sou todo certeza.

Cerâmica mil vezes estilhaçada por crianças inconsequentes
Correndo, ávidas pelo jogo.
Copiosamente reconstruído dos cacos
É preciso que habitue ao molde das delicadas mãos da ceramista enquanto o mundo gira impulsionado por ela.

Maldita

Assim, ao longe, és apenas uma ideia,
uma lembrança do futuro que já vivemos
ou viveremos.

Assim, ao longe, és maldita.
Maldita por não mais me reconhecer em meus olhos
mas me fazer reconhecer nos teus.
Maldita por estranhar o que se destrói e reconstrói em meu peito.
Maldita por ter de refazer os meus planos.
Deliciosamente maldita.

Assim, ao longe, és uma imagem
pronta para me aceitar também e aquém do teu corpo
n'alma.
E enquanto tocam os sinos do mundo,
extasiado entro em tua vida.

17 de agosto de 2010

Passagem

Comboio que passa.
Trem que parte.
Navio que apita.
Outono que chega
e cai do alto das árvores.

Enquanto tu ficas, imóvel e melancólica,
à espera.
Até que eu, perdido, te encontre enfim.
E possamos embarcar juntos
num vagão sem destino
com janelas para o mundo.

13 de julho de 2010

Que fizeste dela?

"A tua vida, que fizeste dela?"
Indaga-me o vento do poema do poeta
na melancólica tarde do feriado vazio,
no desaguar do rio do tempo,
apavorante sensação de estio.

Derramei-a sobre páginas que esfarelam-se, e
troquei meus dias de sol por
retângulos de papel que não me pertencem.

Profusão de ações tão mecânicas quanto necessárias:
ida ao banco e ao supermercado,
festas em ambientes climatizados com o sem-sentido,
horas sentado ouvindo zurros para aprender a ser espantalho.
Tantas cerimônias do desamor fado!

Voluntário abandono de mim,
revolto-me às vezes às vésperas do caminho
para retomar o curso das águas

E devolver-me o direito
ao delicioso tédio
de observar a vida que vai embora
admirando, através do vidro da janela que embaça,
a chuva que cai lá fora.

1 de dezembro de 2009

Dizem

Dizem que devo amar o próximo,
mas não dizem que próximo é esse.
Todos?
Amar todos? Hipocrisia.
Não, obrigado. Prefiro a cruel honestidade.
Se amar, devo escolher quem. Se os amo, os protejo e os faço especiais para mim.
E para isso é preciso que eu os coloque acima de outros.
Como amar quem não conheço? Burrice.
Não, obrigado. Prefiro a limitada inteligência.

Dizem que devo estender as mão,
porque elas são boas e úteis quando firmes e limpas,
caso contrário, restará apenas a chuva.
Não é difícil me culpar pelo orgulho e pela amargura.

Dizem que devo fazer algo para o mundo,
um mundo que nunca fez nada por mim,
nem por ninguém.
Um mundo indesejado e decadente, que não escolhemos.

Dizem que devo agir,
mas não dizem por quê.
Dizem que a outra opção possível é a inércia
e que só me cabe escolher,
mas não dizem é o porquê de ter que escolher.
Não dizem porque, porque não sabem porque,
apenas dizem. Porque é bom. Que diante do bom, não é importante o porquê.
Mas não posso suprimir em mim essa fome de sentido,
onde minh'alma vaga fareja o porquê. Fareja a aurora e o crepúsculo, onde o insucesso sempre retorna.

Querem dizer que não tenho importância só para mim.
Sou apenas se para-os-outros. Sou se servil.
Querem dizer que sou fraco por ser só. Querem dizer que preciso deles para ser.
Mas não podem. Falam detrás de máscaras.

Por fim,
dizem que desperdiço, que traio, que poluo.
Temem não ser eternizados.
Conhecem e repudiam a podridão em que chapinham tanto quanto eu.

Exalto a diversidade. Da única vida que tenho e à qual digo "sim". Na qual explodo e experimento.
Repugna-me a violência, não por ser o próximo,
mas por ser um outro, que bem poderia ser eu.
Na elegia do egoísmo, defendo a minha raça.
Minha revolta é indolente e metafísica.
Minha ação é interior. Minha oferta é a tolerância. E isso é mais do que jamais fizeram ou proporcionaram.
Mas isto não dizem. E nunca dirão.

20 de outubro de 2009

Por Favor

Por favor, faça isto por mim,
Só lhe peço isto:
Me dê à luz, abra meus olhos,
Me ensine a falar e a usar as farsas.
Acompanhe meu crescimento e me engane
Dizendo que o mundo tem cores.
Me agrida e grite comigo como se eu entendesse tudo.
Me faça parte do rebanho sem pedir minha opinião.
Seja minha mãe, me embale no colo,
Beije minha testa à noite e na noite seguinte
Se suicide
Por desencanto com a vida.
Ah, por favor
Seja meu pai, meu modelo, minha meta
E depois me rejeite, chute e cuspa.
Desapareça sem satisfação.

Me ame, diga que me ama.
Faça juras de amor eterno para mim.
Então me traia.
Me culpe por isso tudo, diga que não mais me ama
E vá embora com lágrimas sem olhos.
Seja meu amigo,
Divida a mesa comigo,
Depois roube meu ouro, meu teto, minha esposa e meu cão.
Seja meu filho,
Faça de mim a tua fortaleza super-heróica,
Mas depois me odeie e sinta vergonha do que sou.

Me dê um emprego
Que me prive da luz do sol,
Que abocanhe meu tempo de vida e preencha meu rosto com rugas
Para me pagar com felicidade de papel
Efêmera, falsa e superfaturada.

Me dê, por favor,
Me dê um revólver
Com o qual possa atirar contra a cabeça.
Mas depois salve,
Me socorra
E salve a vida que não quero.
Devolva a minha respiração sem movimento e sem sanidade.
Acabe de roubar o que eu já não tinha mais
E me abandone para sempre num chão úmido de um canto escuro
Onde eu não veja a luz, não coma, não beba
E alivie-me sobre mim mesmo durante anos.
Até que meu coração pese tanto
Que não tenha mais força para continuar batendo.

E então, finalmente,
Ah, sim, por favor,
Arranque minha alma
E a arraste para o inferno
Como paga aos meus pecados.
Obrigado.

17 de agosto de 2009

Ulisses desamarrado

Com os pés descalços na areia
E os olhos entre o céu estrelado,
Cria forma, tu, celeste sereia
Tomando meu coração com teu canto
Até que todos os sons do mundo
São tua voz de paraíso chamando meu nome.

Textura de nuvem, brisa suave, visão do trigo maduro.
Meu coração é sempre e cada vez mais teu,
Através de um oceano de alma incendiada.
Já não vivo senão embriagado em teu perfume.

Sou serei o refúgio onde aportam tuas mágoas, lágrimas e cansaços.
Sou serei o eco dos teus risos, a sombra dos teus passos
E o amanhecer dos teus coloridos olhos.
A habitação aquecida das frias noites de inverno.
Reconfortante aragem que sussurra...
Te amo.

18 de maio de 2009

Fantasma

Ó fantasma, fantasma de incomparável beleza,
Que és? Súcubo diurno ou anjo de luz dourada?
Assombras meus dias e minhas noites com tua imagem onírica
E permanece calada. Por quê?
Será por que também eu emudeço diante de ti?

Tua boca é o silencioso túmulo do meu amor
E teus olhos tristes o reflexo da minha dor, que também é tua.
De repente, vais embora.
Deixando para trás perfumadas pegadas de jasmim
E os esvoaçantes cabelos, feito véu de ouro das núpcias adiadas.

Fica somente o porquê. Mas não o porquê de vires.
Isso o sei bem, desde que nasci, agora percebo:
Vieste para me fazer ver além dos meus olhos, me emprestando os teus,
A tal ponto que ter vida e ver os teus olhos se tornassem a mesma coisa.
E eu seria feliz.

Mas por que, por que foste embora?
Tão triste e sem palavras?
Também eu não pude dizer nada.
Serei eu
Fantasma para ti,
Assim como és fantasma para mim?

9 de janeiro de 2009

Busca da Verdade

Despi as roupas e saí para fora, no frio, enfrentando o vento cortante.
Olhei tempo demais para a escuridão e nenhuma luz penetra mais em meus olhos e eu só enxergo dentro de mim.
Vociferei contra Deus e abandonei o convívio dos homens.
Tudo pela lucidez desesperada que me traria a Verdade.
Mas ah, a verdade é que não existe Verdade.
Só existe eu: sozinho, cego e nu.

9 de dezembro de 2008

Revelação

Fugindo às celas da mente,
corro pelas ruas, vestido de crueldade,
cuspindo, contra o vento, escarros de amargura.
E para todos os seres sou ao frio aço semelhante,
mas para meu amor sou apenas ternura.

Cansado de percorrer solitário
os desertos sombrios da Existência,
me deparo com tua paradoxal presença:
doce, comovente e perturbadora, que
desequilibra, derruba e faz levitar.

Entre lágrimas, sorrisos e dúvidas
um amor desponta tímido e, como o sol,
dissipa todas as trevas.
Confere sentido, calor, alegria e propósito
ao árido caminho de um construto.

Meu destino é o que me leva a ti,
que tens o semblante refletindo meus sonhos e que
rouba a minha alma num beijo.

24 de março de 2008

Cansado

Estou cansado.
Cansado de acordar as manhãs.
Cansado de ver o dia nascer e morrer ante meus olhos cansados de ver.

Cansado de observar a lua nua crua na rua me mirando do céu,
como se até ela notasse e anunciasse o meu cansaço.

Cansado de toda essa gente
zanzando intermitente,
epalhando pólen e colhendo néctar para levar o mel
a uma colméia sem rainha.

Cansado de ouvir o som,
esse zum-zum-zum irritante
de anúncio altissonante
do tédio que não tem fim.

Cansado de cheirar o monstruoso amontoado mal-cheiroso
de um mundo supérfice que apodrece.

Cansado de tanto arrosto
apenas para provar o gosto insosso
e tocar a parede fria
num sem-sentido dos sentidos.

Cansado de fazer planos
para um futuro que nunca chega.
Um futuro que não existe fora dos meus sonhos cansados de sonhar.

21 de novembro de 2007

Deixei

Deixei de almejar as alturas.
Deixei de abrir as janelas.
Deixei de passar pelas portas.
Deixei de mergulhar em águas bravias.
Deixei de caminhar pelas estradas.
Deixei.

10 de setembro de 2007

O Mundo Através da Janela

Da minha janela eu vejo o mundo correr
Vejo a guerra sem fim exterminar a humanidade
Vejo a miséria castigar o ser humano
Vejo a ganância explorar a desigualdade
Vejo uma ideologia dominar o pensamento
Vejo a ignorância perpetuar a intolerância
Vejo o egoísmo esquecer do futuro
Vejo a indolência desprezar a mudança

Da minha janela eu vejo o mundo correr
Terei motivos para sorrir antes do fim?

Da minha janela eu vejo o mundo
Vejo a coragem enfrentar o medo
Vejo a solidariedade auxiliar na necessidade
Vejo fé fortalecer o espírito
Vejo a inteligência resistir á manipulação
Vejo o povo pedir paz
Vejo uma vida nascer a cada segundo
Vejo a esperança projetar um futuro melhor

Da minha janela eu vejo o mundo
Terei motivos para sorrir antes do fim.