9 de junho de 2012

Elegia à ausência

Patrícia: 12/06/1986 - 09/06/2011.

 Há um ano, eu, um homem duro de uma raça de homens duros, chorava feito uma criança inconsolável. Perdia um dos meus primeiros amores, minha primeira inimiga, perdia um pedaço da minha memória, da minha infância, da minha vida. Perdia a minha irmã. Lá estava ela acomodada, mas ainda era tão bonita, tão linda, tão jovem. Perder aquela beleza para sempre me comoveu como nunca nada me comoveu antes. "Tão linda, tão linda" eu repetia. Lembrarei sempre daquela noite fria e daquele dia nublado, no qual até mesmo o sol havia se retirado, junto com a beleza e vivacidade que sumiram para sempre. O mundo ficou um pouco menos bonito naquele dia.

 Talvez o acaso nos tenha feito irmãos. Mas foi por vontade que permanecemos irmãos. Desde as mentiras da vida até a tristeza de "dar a volta por cima". Pudemos, juntos, aprender um com o outro e melhorar-nos. Porque passando metade de uma vida juntos, é impossível que um não seja um pouco como o outro, mesmo que fôssemos tão diferentes. E isso era bom, pois um complementava o outro e ensinava. Ela era animada, sorridente, simpática, extrovertida e inconsequente. O que eu nunca fui, e isso era o que me fazia feliz nela. Ela falava que na divisão das virtudes ela tinha ficado com a beleza e eu com a inteligência. Isso era, em parte, uma inverdade. Embora não fosse estudiosa, era uma pessoa muito esperta e sagaz. Tinha a inteligência que me faltava, a inteligência da vida. Mas sim, ela era linda! Uma das mulheres mais lindas que eu já conheci.

 Na escola era melhor manter distância, porque aprendemos que nerds e patricinhas não se misturam. A menos que sejam irmãos. Num filme adolescente, ela seria a vilã, mas na vida real ela foi a heroína da minha infância. Claro que nem tudo foram rosas. Se ela fosse uma, seria uma cheia de espinhos. E eu pude sempre odiá-la. Como irmãos que amam se odiar e odeiam se amar. E brigamos ostensivamente, de forma violenta, de ambas as partes, às vezes. Para depois, adultos, lembrarmos daquelas brigas com sorrisos e falsas promessas de revanche.

No último recado que me escreveu antes de deixar a todos nós, disse que eu seria sempre um modelo de homem pra ela: "aquele que fala o que pensa". Ainda me emociono quando leio, porque é verdade. E porque me consola ela entender, depois, que todas as vezes em que fui chato, certinho, careta, ranzinza (ainda criança), era a minha forma de tentar protegê-la. Porque eu era o mais velho, não só pela idade (3 meses a mais), mas também pelo temperamento e comportamento: consciente, responsável, chato. Que eu sempre me preocupei. E acuso-a de ser uma causa das minhas primeiras precoces rugas. E para mim ela também será sempre um modelo de mulher: aquela que faz o que sente. Até o fim.

No mesmo último recado, disse: "não é preciso ter o mesmo sangue para ser irmãos, nem estar perto para amar". Tem razão, nunca foi preciso o mesmo sangue para sermos irmãos. E nunca será preciso que esteja perto. Só queria ter dito antes uma palavra de carinho, plena de significado, que minha dureza não permitiu: um "te amo". Espero que tenha sabido disso antes do fim, embora eu pouco me permiti demonstrar.

Por fim, na minha estranheza de vincular pessoas a personagens literários ou trechos, poemas, ou qualquer coisa do tipo, para mim, minha irmã e o poema abaixo do Mario Quintana estão para sempre indissociáveis:


Torre Azul

"É preciso construir uma torre
- uma torre azul para os suicidas.
Têm qualquer coisa de anjo esses suicidas voadores,
qualquer coisa de anjo que perdeu as asas.
É preciso construir-lhes um túnel
- um túnel sem fim e sem saída
e onde um trem viajasse eternamente
como uma nave em alto-mar perdida.

 É preciso construir uma torre…
É preciso construir um túnel…
É preciso morrer de puro,
puro amor!…"

 - Mario Quintana

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Adeus, Piti. Descanse em paz.