9 de maio de 2011

5 Livros Favoritos

A lista que segue foi originalmente elaborada para ser publicada no Fórum Valinor, no tópico "Cinco Livros Favoritos com Kainof".

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Os livros foram escolhidos por autores. Poderia pegar qualquer livro de qualquer dos autores a seguir arrolados e seriam todas boas escolhas. Seleciono os seguintes por serem os meus preferidos ou por serem os mais marcantes na minha vida. O resultado foi uma lista até bem variada em estilos, embora semelhantes no assunto: ensaio filosófico, romance, dramaturgia, poesia e epopéia. Alguns bem clássicos e outros quase desconhecidos, apesar da fama e aclamação no meio literário, como são os casos dos agraciados com o Nobel de Literatura, Beckett e Camus. Espero que se inspirem e interessem por essas obras.

O Mito de Sísifo – Albert Camus


“Só existe um problema filosófico realmente sério: é o suicídio. Julgar se a vida vale ou não vale a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia”, assim começa o ensaio “O Mito de Sísifo” do franco-argelino Albert Camus. Um livro destinado a lançar questionamentos antigos sobre modos contemporâneos de viver o mundo. Um livro que trata já dos principais motes de Camus: o absurdo e a revolta.

Na mitologia grega, Sísifo, após enganar os deuses, é condenado no pós-vida ao castigo de rolar um imenso rochedo montanha acima e, quando prestes a concluir a tarefa e alcançar o topo, o rochedo despencava morro abaixo, obrigando Sísifo a recomeçar a tarefa, e assim infinitamente. Sísifo é o símbolo do homem absurdo, o homem atual, ocupado em tarefas inúteis e desgastantes para nada, para o fracasso, para após isso recomeçar tudo outra vez. “No topo é possível imaginar Sísifo feliz”. O objetivo não importa só a tarefa, a revolta diante do absurdo da existência. O niilismo de Camus é positivo, no sentido em que dispõe a invalidade de tudo não ser motivo para a apatia. O absurdo conduz ao cansaço, mas este inaugura a revolta do Homem que se vê diante de um mundo ausente onde somente a sua ação sobre ele pode lhe dar uma significação.

Esse foi o livro que mais influência teve na minha formação recente. Marcou-me profundamente e foi responsável por uma secessão de epifanias. Talvez pelo momento em que eu vivia, esse era o livro que eu estava esperando para ler naquele momento. Pois livros, sobretudo, fazem-se bons não só por autores, mas por localidades, por leitores e por momentos.

Malone Morre – Samuel Beckett

Malone é um talvez homem talvez velho talvez doente talvez ainda vivo talvez deitado em uma talvez cama talvez internado em um talvez hospital. Não é possível determinar nada com exatidão em toda a narrativa. Aparentemente, Malone é um idoso moribundo de cerca de 90 anos, incapaz de

se levantar da cama mais do que alguns centímetros, que narra com enfadonha descrição os meios pelo qual se utiliza para gastar o tempo de viver. Prosseguir, apenas isso, porque, por vezes, continuar, em simplesmente continuar é que consiste a verdadeira superação. Em um mundo privado de sentido, banal, irracional, Malone torna comum o absurdo da vida humana e naturaliza a decadência.

Para matar o tempo até a morte, Malone cria teorias, inventa histórias, faz rememorações (não importa se precisas ou verdadeiras), sente e vigia o próprio corpo (ainda que seja incapaz de manter o controle total sobre ele). “Sim, tenho meus pequenos passatempos”, repete o personagem título. Até que venha o inevitável é preciso continuar.

Uma linguagem coloquial, com interrupções de ideias, frases incompletas, parágrafos por vezes extensos demais com pluralidade de assuntos nem tão complementares. A prosa de Beckett é inusual e transforma o tédio em assunto de interesse. Suas tragédias não são boas nem más nem chocantes, são tornadas apenas cotidianas e naturais, como uma conversa no café-da-manhã.

Hamlet – William Shakespeare


O procrastinador, vingativo, rancoroso e sorumbático príncipe da Dinamarca dá-se com a aparição do fantasma de seu pai morto há pouco onde este lhe conta que foi assassinado traiçoeiramente pelo irmão e esposa. Enfurecido, Hamlet vaga pensativo planejando a vingança enquanto presencia a falsidade dos homicidas. Obcecado pela vingança ao seu modo, não tem atenção para mais nada, a ponto de rejeitar o amor de Ofélia, e nem ao menos demonstrar grande remorso ao saber do suicídio dela após o fato. O desfecho da peça, por fim, é apoteoticamente trágico.

Hamlet, além da intensidade do enredo, tornou-se um clássico, penso, pela história e personagens arquetípicos. Eles são descritos, características que se combinam, mas são estereótipos e generalizantes o suficiente. Assim o hipócrita, ganancioso e sensual Cláudio; o falastrão, empolado e pedante Polônio e o próprio Hamlet, com suas reflexões e titubeios acabam por tornar-se signos de personalidade e comportamento.

Onde há identificação entre leitura e leitor, onde realidade vivida e narrativa sonhada se encontram há a sinergia necessária para transformar palavras em sublime. À parte ser um príncipe dinamarquês (nobre, alto, belo, louro... ), a melancolia existencial evidenciada em seus momentos de solidão por solilóquios dramáticos, a procrastinação, a obsessão cega e o repúdio às convenções hipócritas da corte, fazem de Hamlet uma personagem familiarmente marcante para mim e uma obra sem par na literatura, múltipla em sentidos e interpretações.

Poemas de Álvaro de Campos – Fernando Pessoa


Fernando Pessoa tem um legado literário interessante: além de poemas próprios, escrevia sob nomes de pessoas com personalidade e estilo próprios sendo essas pessoas ele mesmo. Despersonalização da pessoa de Pessoa (entre outros trocadilhos fáceis e infames). Publicou apenas um livro em vida e poesias esparsas em revistas de literatura, entre as quais uma que ele mesmo era editor.

Entre seus heterônimos, o mais vibrante parece ser Álvaro de Campos, poeta inicialmente eufórico, da modernidade, da experimentação juvenil. Logo após melancólico, da modernidade, do tédio, do cansaço e da angústia existencial. É de Álvaro de Campos o poema “Tabacaria”, um dos mais representativos do estilo e do tema tão caro a Pessoa: as sensações, o fracasso, a utopia desenganada, a incerteza, a divisão entre a “vida vivida e a vida sonhada”.

Álvaro de Campos, na opinião do próprio Pessoa, é o mais sentimental dele mesmo. De fato, as poesias de Campos são puro sentimento, em sua maioria introspectivos e pessoais. Nos poemas de Álvaro de Campos a tristeza adquire a beleza suficiente para tornar-se arte.

Odisseia – Homero

A existência de Homero é questionável. Um único homem, rapsodo (“declamador”) e cego, segundo a tradição, autor dos 24 cantos que compõe a obra escrita no século VIII a.C. parece mesmo inverossímil. Fora as diferenças de linguagem e estilo originais nas variadas partes da história e desta com a outra epopeia homérica, a Ilíada. Nada mais natural para algo que foi escrito há milênios e traduzido e transcrito diversas vezes ao longo dos séculos. Um livro que é das maiores obras da humanidade, tanto em beleza, quanto em influência e significação.

Odisseu, após passar dez anos guerreando em Tróia, passa mais dez anos vagando no mar tentando encontrar o caminho de casa, na sua amada ilha de Ítaca. Ao longo do percurso, sofre tantas acidentes e percalços que da tripulação só resta o seu comandante. Odisseu, na viagem, conta com o auxílio da deusa Atena, mas com a inimizade de Poseidon, o deus dos mares, que através de monstros e correntes marítimas desfavoráveis prejudica o marinheiro de encontrar a rota para casa. Enquanto isso, em Ítaca, sua fiel esposa Penelope aguarda pacientemente o retorno do marido, mesmo assediada por pretendentes ao trono e ao casamento com a rainha, que dissipam os bens do rei em festas.

A Odisseia tornou-se símbolo da busca incessante do herói ao seu destino, que para atingi-lo precisa superar grandes desafios e sofrimentos. Símbolo das grandes aventuras heróicas e desesperadas. Se hoje nos soa clichê esse gênero, é devido a esta obra, escrita há milênios, e desde lá introduzida no imaginário ao ponto de pertencer ao âmago da cultura ocidental, inspiradora de um sem número de outras criações artísticas. É uma obra belíssima, com suas descrições sublimes e os epítetos marcantes e poéticos de Homero. Quanto a Odisseu, o solerte Odisseu, um modelo do homem grego, que apesar de suas elevadas qualidades físicas e de distinção nobre, sobressai-se preferencialmente através do intelecto. Foi assim que venceu o ciclope Polifemo, ouviu as sereias sem perecer, enganou a feiticeira Circe e armou a cilada para exterminar os pretendentes.

Em minha vida esta foi das obras mais marcantes, que li aos 15 anos com dificuldades imensas devido ao vocabulário e extensão. O dicionário foi companhia constante ao longo dos dias febris e empolgantes que passei junto ao livro. E de curioso passei a obcecado por mitologia e cultura grega, assunto que me consumiria na adolescência até o início da faculdade.

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